IDENTIDADE TERRITORIAL X AÇÕES PONTUAIS PARA O DESENVOLVIMENTO DO TURISMO

Por: Jorge Silveira Duarte

Este artigo propõe uma reflexão sobre os desafios enfrentados pelos municípios na identificação, reconhecimento e construção de uma identidade territorial distintiva. Essa identidade, ancorada em elementos culturais, históricos e geográficos, é crucial para conferir vantagem competitiva na atração de turistas, especialmente em um contexto de globalização econômica e cultural.

A compreensão da identidade territorial, conforme abordada no artigo “Identidade Territorial e Desenvolvimento Local e Regional entre Retórica e Prática” (1), destaca sua complexidade e inovação, centrando-se na singularidade das realidades geográficas e humanas. Elementos como cultura, história, localização e idioma são fundamentais para a construção dessa identidade, que se torna um diferencial competitivo diante das forças globais.

Rogério Ruschel, em seu livro “A Identidade Territorial Como Estratégia de Marketing: O Valor Local do Produto Local” (2), conceitua a identidade territorial como o conjunto de características tangíveis e intangíveis que associam uma pessoa, produto ou serviço a um território específico. Destaca-se a importância de utilizar esse diferencial competitivo de maneira estratégica, proporcionando uma experiência turística autêntica.

Destaca ainda que o município é um conceito político, de gestão, onde acontece o exercício do poder, que está inserido em um território, um conceito mais amplo do que o próprio município. E, também um conceito geográfico que engloba questões socioculturais, ambientais e econômicas que forma o patrimônio territorial. Por isso existem roteiros turísticos baseados em patrimônio territorial. Cito exemplos de roteiro regionais baseados em patrimônio territorial, no estado de São Paulo, como: Caminhos da Fé, Cavernas da Mata Atlântica, Serra da Mantiqueira, Rota Caipira, entre outros tantos que existem. Podemos dizer que cada um desses roteiros têm as suas próprias características locais que são os elementos constitutivos da sua identidade que os diferencia de outros lugares.

E outro ponto relevante do livro trata de que “os valores de um produto territorial não podem ser copiados, falsificados, modificados e agregam valor porque proporcionam uma experiência turística com identidade.” Também: • Evita comparação direta de preços • Oferece diferenciais competitivos • Aproveita oportunidades de nicho • Ganha espaço e visibilidade nas redes sociais • Atrai compradores pioneiros • Tem ciclo de vida ampliado.

No entanto, observa-se que muitos municípios, especialmente os pequenos, não adotam a identidade territorial como uma estratégia de desenvolvimento turístico. Mesmo possuindo elementos distintivos, esses destinos frequentemente optam por ações pontuais, como a realização de eventos desconectados de sua identidade territorial, negligenciando estratégias de marketing eficazes.

Fazendo uma comparação desse conceito identidade territorial com “Marca-lugar, ou “place branding” destaco um artigo publicado neste site com o título “Place Branding: Transformando um destino numa marca-lugar” (3). Uma das definições aponta que a “Marca-lugar, ou “place branding” refere-se à identidade de um lugar e o conceito do que o move.”

Direcionando o conceito para um destino turístico poderíamos dizer que a Marca-lugar se constrói com a soma dos elementos e ações que valorizam todas as características importantes do local e que ao tornar-se referência poderia promover o turismo e o desenvolvimento do local. E, ainda que marca-lugar é a própria identidade territorial que destaca o destino como verdadeiro, real, legitimo, único, portanto, ansiado para conhecê-lo.

Mas porque municípios — fundamentalmente os pequenos — apesar de possuírem uma identidade territorial ou dito de outra forma elementos que os distinguem dos demais não adotam como estratégia este diferencial competitivo?

Uma possibilidade para essa resposta é que ainda que diversos municípios descrevem orgulhosamente sobre características únicas do seu lugar e no discurso tornam aquela identidade sublime, não definem ações estratégias para implementar planos de marketing com este foco.

Em suma verifica-se que a identidade territorial não está presente nas estratégias de desenvolvimento do turismo e ainda que esteja descrito no planejamento, na prática as ações buscam alternativas pontuais, aparentemente mais fáceis de executar como a realização de eventos, nem sempre conectados à identidade do local.

E, de existir um plano que não se executa pode significar que a proposta não tinha governança forte ou consolidada para fazer acontecer. Aparece neste momento o tema das forças locais, dos influenciadores. No turismo eles compõe na sua grande maioria os conselhos municipais que agregam o poder público e a iniciativa privada com e sem fins de lucro. E ainda temos um entrante cada vez mais atuante, ainda que disperso e privado de qualquer organização, planejamento e diálogo que são as mídias sociais, chamadas de redes sociais. Também estão os gestores públicos, geralmente centralizadores que buscam realizar e apoiar eventos para movimentar suas cidades, mas desvinculados da identidade territorial.

Então o desenvolvimento ou destruição da identidade territorial pode depender das relações de forças de poder que existem entre os influenciadores de um local.

Citando o exemplo de Águas de São Pedro-SP, um dos elementos que a cidade tem e que compõe a sua identidade territorial é o Aspecto Geográfico. Possui de forma natural águas minero medicinais com alto teor de enxofre, sendo superada somente por uma cidade da Itália. Do ponto de vista da raridade podemos afirmar que as águas podem ser até um destaque mundial. Três aspectos merecem destaque: O poder de remissão de dores e doenças por meio dos banhos com a água sulfurosa (Fonte Juventude) pode atrair a atenção de turistas do mundo todo. A Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares de 2006, estabelece que a utilização de águas minero medicinais e sua aplicação em tratamentos de saúde são um potencial terapêutico para recuperar, manter e promover a saúde e as águas, são uma das principais razões da criação dessa Estância Hidromineral.

Sendo a segunda água do mundo em teor de enxofre, sulforosa, bicarbonatada e clorosulfatada, é apropriada para a diminuição do stress, hipertensão, reumatismo, obesidade e problemas de pele.

Mais elementos de aspectos geográficos se agregam à identidade territorial como por exemplo a cidade é planejada. O desenho dos loteamentos caracterizam-se pelo traçado orgânico, pelo respeito à morfologia do solo, com arruamento em curvas de nível, mantendo nas bordas das praças os ajardinamentos que garantem uma área verde que ocupa 50% da cidade.

Somente estes dois aspectos já criam nesse local um ambiente da saúde e bem estar únicos.

O plano de turismo em vigor desde 2021 evidencia a proposta de trabalhar essa identidade. No entanto desde essa época a cidade tem empreendido fortemente em eventos musicais e mais recentemente na festa natalina como forma de atrair público. E está atraindo. Trazer gente nova para conhecer a cidade e consumir é muito do que se espera com o turismo. Mas sente-se a falta de trabalhar a identidade territorial como um fator de desenvolvimento e a falta de um plano estratégico pode ir destruindo a imagem, a identidade, a exclusividade e tantas outras coisas únicas que são o patrimônio desse local.

Os “influenciadores” locais, como os conselhos municipais e as redes sociais, desempenham um papel crucial na definição das estratégias de desenvolvimento turístico. A importância da diversidade local e da identidade territorial é ressaltada por diversos estudiosos e organismos, como a Comissão Europeia, que destaca a necessidade de valorizar elementos promissores e neutralizar obstáculos à identidade territorial para alcançar o desenvolvimento local.

Em síntese, o desafio reside na construção de estratégias de longo prazo, baseadas em diálogo e confiança entre os atores locais. É essencial que a identidade territorial não apenas orgulhe moradores e turistas, mas também se torne uma fonte sustentável de desenvolvimento, promovendo um turismo autêntico e enraizado na singularidade de cada destino.


Referências

1. Identidade Territorial e Desenvolvimento Local e Regional entre Retórica e Prática    Zoran Roca e Carvalho Mourão. Unidade de Estudos e Investigação em Ciências Sociais Aplicadas Universidade Lusófona de Humanidades. https://www.apgeo.pt/files/docs/CD_IV_Congresso_APG/Actas_CD/Comunica/emerg_sp/idet_ter.pdf Acesso em 25/12/2024, 11:50

2. RUCHEL, Rogerio.. O valor Global do Produto Local. Editora Senac São Paulo. 2019.

3. Place Branding: Transformando o destino numa marca-lugar               Ana Raquel de A. Dias https://desenvolvimentolocal.com/2021/09/08/place-branding-transformando-um-destino-numa-marca-lugar/ Acesso em 26/12/2023. 12:30

Jorge C. Silveira Duarte Psicólogo, com pós-graduação em Recursos Humanos e especialização em Desenvolvimento Local pelo Centro Internacional de Formação da OIT/ONU/Itália, com  MBA em Gestão e Empreendedorismo Social pela FIA/USP e com formação em Coaching pela Jyväskylä University of Applied Sciences/Finlândia. Trabalhou no Senac São Paulo de 1997 à 2021 com desenvolvimento de comunidades e planejamento municipal e regional do turismo. Criou os programas Rede Social, Desenvolvimento Local e Regionalização do Turismo.

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